Sabe. Não sabe. Já não se lembra. Misturou tudo. Está baralhado. Agora fez tudo bem!

É largamente aceite a ideia de que quem treina mais e melhor, obtém resultados melhores e mais rapidamente. De forma geral é isso que acontece. Se olharmos para um grupo de atletas reparamos que todos são diferentes, haverá excepções realmente diferentes mas a média tenderá para confirmar o que nos diz o senso comum: quem treina mais e melhor, torna-se melhor mais depressa.

Contudo, olhando para cada atleta individualmente é fácil notar que a evolução não é linear. Mesmo treinando muito e bem, não se aprende ou melhora ao mesmo ritmo ao longo do tempo. Nos caso dos adultos, é frequente o próprio atleta aperceber-se das fases em que se sente estagnado e dos momentos "Eureka" que proporcionam mudanças significativas. Nas crianças não é bem assim... Apercebem-se que sabiam fazer coisas e que agora não se lembram. Outras vezes estão reticentes em fazer um exercício que anteriormente falharam, mas mais ou menos contrariados, lá tentam e desta vez têm sucesso à primeira. Não sabem porquê, nem querem saber, mas ficam contentes e confiantes.

É importante para os treinadores identificarem estes saltos de aprendizagem e agir em conformidade. Quanto o atleta está confiante porque conseguiu fazer algo que tinha a certeza que não iria conseguir é uma boa oportunidade para introduzir alguns exercícios diferentes e estimulantes. Não demasiado complicados que voltem a pôr em causa a motivação do atleta, mas mais desafiantes. Ele vai aceitar porque naquela fase confia também no treinador. É importante terminar a sessão com exercícios em que o praticante tem sucesso e sente que está a fazer bem. No próximo treino estará lá novamente à procura de mais desafios para conquistar.

E quando parece que desaprendem?
Esta é provavelmente a sensação mais desesperante para os treinadores. Eles sabiam fazer isto mas agora já não sabem. Fizeram bem na semana passada e agora não se lembram. Fizeram tudo certinho no exame de graduação e agora passados uns meses parece que nunca fizeram tal coisa, nem sabem o nome, nem como começar o exercício.
Parece que os saltos de aprendizagem trazem consigo alguns fossos de memória. Mais vale não desesperar porque vai acontecer mais vezes. As razões podem ser várias mas com tempo e treino tudo volta ao normal.
Entretanto, a solução SOS pode passar por insistir imediatamente no exercício repetidamente, prática que só resultará se o atleta estiver incomodado pela sua falha e prontamente motivado para a corrigir. Os obcecados e perfeccionistas não conseguirão concentrar-se em mais nada enquanto não corrigirem o erro.
Se os atletas (geralmente crianças) não têm noção ou não se importam com a falha também não estarão motivados nem compreenderão a necessidade de insistir repetidamente num exercício que provavelmente até nem gostam e não os estimula. Neste caso, outra solução SOS pode ser desvalorizar o sucedido e dar a volta à situação através da prática de exercícios diferentes mas relacionados. Treinar o mesmo mas de formas diferentes é geralmente benéfico e ajuda a memorizar sequências e automatizar gestos técnicos.

Fast starter
Há alunos que desde tenra idade dão sinais de ter aptidão para determinada modalidade. Se tiverem a sorte de juntar o talento à vontade de treinar, começam rapidamente a progredir. Em escalões de formação é fácil identificar um ou outro que se destaca dos restantes e pensarmos: "Este pode ir longe. Se não desmotivar e desistir por algum motivo, vai ter um bom futuro."

Slow starter
Outros alunos não começam tão bem mas adquirem competências de forma contínua com o seu esforço e empenho. Parecem ter muitas lacunas numa fase inicial, o treinador percebe que vai ter muito para moldar mas sabe que o aluno é dedicado. Um dia olha-se para ele e pensa-se: "Quando é que ele se tornou tão bom?! Nem reparei que já tinha melhorado tantos aspectos e que agora está a este bom nível."

Uns e outros podem justificar tratamentos diferenciados. Sei que posso puxar mais por um fast starter do que pelos seus colegas porque ele tem capacidade de assimilar mais conteúdos, mas no dia em que lhe faltar a humildade será imediatamente chamado à atenção.
Sei que não devo exigir demasiado de um slow starter porque ele não consegue fazer correctamente muitas coisas que os colegas conseguem, mas quando obtiver um bom desempenho o momento será assinalado e encarado como um marco na sua evolução.

São muitos os factores que contribuem para a formação geral do atleta mas um dos mais influentes é o feedback que recebem dos pais e o quão estes se envolvem neste percurso. Há pais aos quais é indiferente a modalidade que o filho pratica, há pais muito preocupados e exigentes com os filhos porque acham que eles deviam saber mais do que sabem ou fazer as coisas melhor do que fazem (geralmente os filhos são slow starters) e há pais que pensam que os filhos sabem mais do que realmente sabem (geralmente os filhos são fast starters) e tentam forçar subida de graduações.

Felizmente no KarateSpace até os pais são bons! Abordam o treinador quando têm dúvidas ou querem saber algo mais e informam sempre que algo se passa com os atletas para que o treinador possa agir em conformidade.

Treinando com vontade e frequência tudo acontece naturalmente, mais rapidamente para uns, mais lentamente para outros, mas no fim bate tudo certo e o sucesso chegará quanto tiver de chegar. Convém relembrar que nas artes marciais, como noutros aspectos da vida, muito do valor está no caminho e não necessariamente no destino.